A <i>troika</i> tem um parceiro! …

Jorge Messias

«Moeda única e Europa estão à beira do precipício» (Jacques Delors, presidente histórico da Comissão Europeia, Agosto de 2011).

 

«Estamos atolados num poço tão fundo que, se cair lá alguém nem sequer temos uma corda para o puxar… a Igreja faz festas muito bonitas e esquece-se de vir para o meio daqueles que sofrem… Tem de ir mais longe! Devíamos vender o ouro que anda ao pescoço dos santos, nas procissões...» (D. Manuel Martins, Bispo Emérito de Setúbal, Agosto de 2011, entrevista ao Expresso).

 

«A sociedade burguesa moderna, construída sobre as ruínas da sociedade feudal, não aboliu os antagonismos de classes. Não fez mais do que constituir novas classes, novas condições de opressão, novas formas de luta, em substituição das anteriores. No entanto, o traço mais característico da nossa época – da época da burguesia – é ter simplificado os antagonismos de classes. Cada vez mais a sociedade se divide em dois vastos campos opostos, em duas grandes classes directamente inimigas: a burguesia e o proletariado» (Karl Marx, Manifesto do Partido Comunista, 1848).

 

Num curto espaço de tempo, a imagem do capital vitorioso degradou-se e entrou num ciclo de acelerada decomposição. O seu estado de ruína é de tal forma evidente que a demagogia dos seus mentores não chega já para convencer as multidões. Os monumentais problemas do imperialismo capitalista estão bem à vista.

Ainda vamos no início do cataclismo e já os céus desabam sobre nós.

Os «democratas» iluminados recorrem cada vez mais ao discurso dos déspotas e dos fascistas. Meteram-se num beco sem saída e não sabem que caminho tomar. Quanto ao Vaticano, também ele cometeu erros de avaliação que hoje lamenta amargamente. Mas que fazer, agora? Os dados estão lançados. Os pobres devem sofrer e calar.

Contavam os antigos que quando alguém se perde numa floresta só tem uma coisa a fazer. Caminhar em frente. Mesmo que se canse por muito ter de andar, sabe que se aproxima da orla do arvoredo, da saída. Caso contrário, perderá o sentido de orientação e a morte espreita.

A hierarquia eclesiástica portuguesa parece ter feito esta escolha suicida. Face aos riscos de perda da soberania nacional, da imposição da miséria ao nosso povo e da destruição dos quadros de valores que a hierarquia proclama serem de inspiração cristã, o alto clero escolheu puxar para o lado da troika. É seu cúmplice confesso e parceiro comercial. Explora o mercado da pobreza. O que leva os bispos a esse procedimento insensato tem nos factos uma leitura directa.

O edifício social vai sendo demolido pelos cabouqueiros. Nos cálculos dos grandes financeiros, em breve a República democrática voará em estilhas. Criar-se-ão assim grandes espaços vazios apetecíveis à gula dos privados. Que fazer então dos «pobrezinhos» abandonados ao seu triste destino e em risco de, finalmente, se revoltarem contra quem os explora? Cuidado, que a fome é má conselheira... Só a Igreja tem capacidade para controlar o vulcão social.

 

Profetas da «Nova Ordem»

 

A Igreja fundamentalista de Bento XVI não pode perder esta oportunidade. O Estado laico está à venda ou, melhor, entrega voluntariamente ao episcopado preciosas fatias da soberania e da República. O Poder Local, a Segurança Social, o Ensino Oficial, a Administração Pública, a Regionalização, podem cair ao primeiro abanão. O cálculo da hierarquia católica é então simples de entender: quando tudo desabar e o Estado «solidário» demonstrar a sua total incapacidade, a Igreja ficará sozinha em terreno com a sua portentosa alternativa de milhares de IPSS, Misericórdias, Fundações, Refeitórios, Centros de Dia, Confrarias, Associações de Fiéis, Ordens Terceiras, Bancos e offshores que dirige em Portugal. Não tarda muito e almoçar exigirá um acto de contrição.

É certo que muitas peças deste gigantesco projecto se encontram ainda em estado embrionário. Falta garantir a sua total dependência do Trono de S. Pedro e fazê-las funcionar em rede social. Tudo, porém, se poderá ajustar. É desenvolvimento que apenas depende do tempo disponível, do rigor da gestão sócio-religiosa e dos níveis de pobreza das classes populares.

A hierarquia católica portuguesa está bem consciente da transcendência do momento que o País e o sistema capitalista atravessam. Os políticos falam? Ainda bem! Deixem-nos falar. Distraem as massas enquanto se ganha tempo e... «tempo é dinheiro». Mas pouco falta para que se acabe a «era dos malabarismos palavrosos»…

A ficção vai dar lugar à realidade.



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